segunda-feira, junho 05, 2006

O Sistema Educativo e a Avaliação da Docência
 
I – O (não) incentivo do Satisfaz

Desde a publicação do DL n.º 139-A/90, de 28/04, conhecido por Estatuto da Carreira Docente que a avaliação da função docente passou a ser definida em três componentes essenciais: módulo de tempo de serviço, obtenção de créditos em acções de formação e, finalmente, um documento de auto-avaliação a que se chama relatório crítico.

Resumindo: até agora os professores eram todos avaliados com a menção Satisfaz, podendo assim progredir para o escalão seguinte da carreira docente, auferindo um acréscimo no seu salário que apenas produzia efeitos no primeiro dia do mês seguinte àquele em que perfazia o necessário módulo de tempo de serviço.

Salvo raríssimas excepções, na actual avaliação docente é atribuída sistematicamente a menção de Satisfaz. A perversidade do modelo de avaliação docente é que a menção de Satisfaz tanto é atribuída aos professores, que por um lado contribuem positivamente para uma Escola melhor, penalizando-os: os professores empenhados, diligentes, preocupados, assíduos, pontuais, com excelente relação pedagógica e com verdadeiro espírito de entrega; como, por outro lado, a todos os outros “docentes” que não revelam nada daquilo que atrás referi, premiando-os.

Concluindo: há cada vez menos, (isto é, não há mesmo) incentivos para os professores com o verdadeiro espírito de missão que ainda, neste momento, vão contribuindo para uma Escola melhor. Por esse motivo a Escola vai cada vez mais perdendo essa espécie de professores entusiastas, optimistas, sempre disponíveis e abnegados que até agora têm sido um relevante motor na dinâmica de muitos estabelecimentos de ensino.

Daí que, dado o modelo existente, que em nada contribui para a melhoria da escola e nem incentiva os professores melhores e mais empenhados. Por isso não poderia concordar com a forma como actualmente é feita a avaliação docente na Escola Portuguesa, reconhecendo também a dificuldade em melhorar o sistema pelo que é essencial produzir estudos e reflexões profundas sobre o assunto.

É urgente valorizar quem deve ser valorizado. Posso adiantar desde já que é essencial introduzir, a todos os níveis, uma rigorosa cultura de avaliação não só dos docentes mas dos funcionários, dos alunos, como também das próprias instituições.

De acordo com a proposta do Ministério não me repugna que os pais e encarregados de educação, possam avaliar o trabalho dos docentes que dão aulas aos filhos; mas de uma forma objectiva, sobretudo apoiada no feed-back da relação pedagógica, inerente ao acompanhamento das tarefas escolares do seus educandos e nunca no plano pedagógico ou científico da actividade lectiva. Afinal alguns pais e encarregados de educação sempre o fizeram, não de forma sistemática e organizada, mas de uma forma implícita, junto dos directores de turma dos seu filhos e dos seus educandos, como também no seio da própria família. O importante é que as regras sejam estabelecidas à partida.

A progressão dos professores dependerá assim do mérito do docente, aferido através de vários mecanismos de avaliação do desempenho, da frequência de acções de formação contínua, da avaliação dos órgãos de gestão da escola em que lecciona e da nota de um relatório crítico da actividade desenvolvida que deve apresentar.



II – Agora o outro lado da questão:

É um facto que há bons e maus professores, assim como há bons e maus alunos, bons e maus filhos, bons e maus pais e até bons e maus ministros! Todos gostaríamos de os poder conhecer e de, com verdadeira utilidade prática, saber distinguir os bons e os maus com objectividade e consequência! Mas, daí a conferir, sem regra, a qualquer um, só porque é pai, o direito de aferir do grau de profissionalismo de um professor, do seu zelo, da sua competência técnica e da sua preparação pedagógica, parece-me que será levar longe demais uma democracia, quando se verifica que muitos pais independentemente de se preocuparem que os filhos saibam, interessa-lhes, principalmente é que os filhos passem.

Nesta complicada “Cultura de Comunidade Escolar” da Escola Portuguesa, a avaliação, seja ela dos docentes ou, no futuro, outros elementos da Escola poderá revelar-se uma matéria sensível. Além dos princípios e dos valores em causa é um acto demasiadamente sério que se reveste de algum melindre, pelo que deve ser tratada com pinças.

Julgar é um acto complexo e extremamente difícil, podendo revelar-se até perverso. Ao contrário das consequências, na avaliação dos professores, os julgados, os julgadores nada têm a temer por não haver quaisquer consequências da sua avaliação errada ou de um eventual perverso acto de julgar. Daí correrem-se sempre alguns riscos no avaliar de professores por alguns pais. E não queria aqui dar enfoque ao universo de elevada percentagem de ignorância e de incultura, mas antes, chamar à atenção, sobretudo, de eventuais paixões de uma qualquer cegueira clubista, a qual pode correr o risco de superar largamente a actividade intelectual própria de seres humanos, conferindo ao julgamento daí emergente prerrogativas decisórias de uma carreira profissional, eventualmente correr-se uma demagógica e perigosa desvirtuação do objectivo em causa.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

A avaliação, particularmente na área da educação, pressupõe, desde logo, o envolvimento efectivo dos participantes no processo.
Quando se pretende uma mudança participativa, o 1º passo traduz-se em motivação intrínseca e extrínseca. Tratando-se de mudança em pirâmide invertida, cabe às estruturas de topo promoverem estratégias incentivadoras.
Um dos actores desta mudança, o professor, tem sido ultimamente o bode expiatório de todos os males na educação. Não defendendo, numa mera perspectiva corporativista, o emepenho de todos os profissionais da educação (aliás, em todas as profissões haverá melhores e piores profissionais, outras variáveis devem ser tidas em conta: as várias reformas propostas cuja avaliação não tem chegado ao público e a instabilidade criada por algumas medidas,por exemplo, o desmembramento de agupamentos, proposto sob a tutela do Prof. David Justino.
A nova proposta de ECD contem alguns aspectos positivos mas a sua imposição sem a participação ,sem a motivação, sem a envolvência dos professores contraria os princípios subjacentes a qualquer processo avaliativo.

junho 05, 2006 9:24 da tarde  

Enviar um comentário

<< Home