domingo, junho 05, 2005

A EURO SEMANA DUM INCÓMODO ANUNCIADO

E que fazer agora? … Seguir-se-à o Nim?...

Ao contrário do que poderá parecer, o [Não] francês é o resultado de um debate democrático e profunda reflexão, na sociedade francesa e não tanto, fruto de uma qualquer deriva nacionalista. Assim sendo, não parece correcto identificar os partidários do [Não] apenas com a "Front National" (Frente Nacional) do populista de extrema-direita, Sr. Jean Marie Le Pen, dado que a vitória do [Não] só é tornada possível com a votação maciça das forças políticas que naquele país se designam genericamente por "La Gauche” (Esquerda), nas quais, segundo os analistas franceses, incluem, em cerca de metade, o eleitorado do P.S. francês que se dividiu devido à adesão ao "Não", do socialista, Sr. Laurent Fabius, (Nº2 do PSF) que acaba de ser excluído da direcção do partido.
Só assim se poderia compreender a vitória do [Não]!.. Que aconteceu? À partida, era impensável colocar do mesmo lado da “barricada” líderes políticos tão díspares como: J.M. Le Pen, De Villiers, Laurent Fabius, Arlette Laguilier ou Marie-George Buffet (uma autêntica salada política que uniu nacionalistas de extrema-direita a comunistas e trotsquistas). Mais do que a reprovação do tratado da U.E. em si, a atitude do eleitorado francês foi, no essencial, uma resposta aos problemas de política interna do seu país e aos próprios políticos em si! Só é possível interpretar os resultados com alguma racionalidade. No entanto, é curioso relembrar que já nas últimas presidenciais o candidato da Esquerda ficou pelo caminho e a Esquerda não tendo outro remédio que votar Chirac”, para impedir uma vitória de Le Pen. Daí que não seria totalmente descabido reflectirmos sobre o peso que a extrema-direita teve neste referendo, isto é; quanto do [Não] poderá corresponder a um crescimento efectivo da Frente Nacional que não tem parado de crescer nos últimos anos!... (O ressurgimento dos nacionalismos na Europa, fazem com que esta questão se direccione não apenas aos franceses, mas sim a toda a U.E., pois estes contestam o que até agora se construiu consensualmente na UE: Maastricht, Schengen, o Euro, ou os alargamentos a Sul e a Leste).
No caso Holandês, além do peso significativo dos nacionalistas de direita, as razões mais invocadas pelos eleitores do [Não] são o descontentamento com o Euro e a frustração sentida pelos cidadãos holandeses de não serem ouvidos a pronunciarem-se sobre a adesão a tratados anteriores e à união monetária, decidida por políticos, mais ou menos, federalistas. Com o referendo, não perderam a oportunidade de retaliar com expressivo resultado.
Defendo que a União Europeia deve continuar a organizar-se como um grande espaço de liberdade; liberdade económica, liberdade de circulação de pessoas, liberdade comercial e de leal concorrência. Não me sinto um federalista, apesar disso defendo a ratificação do Tratado da Constituição Europeia, que é importante para definir as regras organizacionais da EU e, por isso, fundamental para os pequenos países como Portugal. Não defendo, a criação de um Super Estado Federal Europeu que reproduza modelos organizacionais semelhantes aos que existem nos EUA ou na Alemanha, baseados em instituições centrais. Os mais euro-cépticos, defendem que a experiência comunitária da U.E. não tem demonstrado a necessidade desse modelo de tratado. Nada mais errado! Afinal falta é saber qual é a verdadeira alternativa dos que defendem o [Não] à Constituição Europeia!
O Tratado Constitucional, apesar de algumas incongruências, rectificáveis, contém indeléveis referências à «Europa Social» que gradualmente tem vindo a ser construída. Não podemos esquecer-nos que a construção da U.E., como qualquer grande projecto humano, tem evoluído com altos e baixos de forma mais ou menos consensual pelas famílias políticas europeias: liberais, socialistas, democratas-cristãos, social-democratas, uma construção baseada na herança que nos advém da Antiguidade Clássica e consolidada em valores judaico-cristãos, com a tolerância e respeito pelo outro, mesmo com aqueles que são e pensam de maneira diferente. É este modelo de organização socio-económico e político, de cariz humanista, que torna a Europa tão atractiva às pessoas provenientes de outros povos e continentes. É este espírito que, apesar de tudo, nos torna orgulhosos do Velho Continente.
É provável que o [Não] da França e da Holanda, (fundadores da E.U) fira de morte o Tratado Constitucional, desacreditando as instituições Europeias tão empenhadas na sua aprovação, pelo que é previsível um período de instabilidade na União Europeia, devido a um mais que provável efeito de bola de neve que acabará por afectar os referendos que vierem a seguir… O desaire Franco-Holandês é também o desaire dos líderes e instituições políticas da U.E. que, de Tratado em Tratado, nunca deram a necessária relevância à opinião das populações que representavam, quando aprovavam ou colocavam os seus autógrafos nos compromissos que sancionavam.
Das consequências previsíveis do [Não] podem revelar-se, em possíveis obstáculos às entradas da Bulgária e da Roménia como, também, ao início de negociações com a Turquia previsto já para o mês de Outubro. Não querendo ser o profeta da desgraça, estou em crer que este falhanço anunciado irá certamente ser celebrado por todos aqueles que nunca desejaram ver uma Europa mais forte e coesa na cena socio-económica-política mundial, sendo previsível que se verifique grande satisfação em: Pequim, Washington, Tóquio, Nova Deli, ou até, imagine-se, nos eternos euro-cépticos ingleses da nossa “Velha Aliança”. E que fazer agora?… Seguir-se-à o Nim?...