sexta-feira, outubro 28, 2005

Portugal, uma questão de elementar Justiça!

Como era de esperar, o congelamento dos suplementos remuneratórios e das progressões automáticas de carreiras, extensivos a toda a Administração Pública, desagradou, como é óbvio, também aos senhores juízes.

Os Tribunais como Órgãos de Soberania, não deveriam nunca prescindir da sua independência, pois é ela o garante fundamental do regime democrático, mas a Associação Sindical dos Juízes (ASJ), não conseguiu disfarçar a falta de solidariedade, para com a restante Administração Pública e, até um certo mau-estar, pelo facto dos seus interesses corporativos serem beliscados e, até, colocados em causa.

Em tempo de crise, quando as medidas de austeridade nos afectam a todos, desde os mais modestos funcionários, passando pelos autarcas, deputados até aos membros do Governo, a que pretexto poderiam os Tribunais e os Senhores Juízes constituir excepção?

Pelo contrário, é precisamente nos momentos de crise económica e social que mais necessária se torna a solidariedade de quem mais pode para com o seu semelhante, sobretudo em favor dos mais desprotegidos e fragilizados. Isto sim, seria um contributo sério para a coesão social nacional.

Descendo desta vez à Terra, os Senhores Juízes, à semelhança dos vulgares mortais, exigiram através do seu movimento associativo, a manutenção dos seus “direitos”, (privilégios) recusando-se a aceitar o mesmo tratamento que os demais funcionários da Administração Pública, esquecendo-se que a harmonização é também uma exigência ética e elementar das democracias.

Esta greve, de um Órgão de Soberania, comprometeu o regular funcionamento do Estado, transformando os seus titulares em vulgares funcionários. Neste contexto, será que as ameaças e insinuações do Sr. Presidente da ASJ, a um Governo com toda a legitimidade democrática, não poderão por em causa a serenidade e imparcialidade que se espera dos Tribunais e dos seus principais actores, os Senhores Juízes? Não deveriam, os senhores juízes, ter sido os primeiros a recusarem-se a julgar em causa própria?

Melhor que ninguém os Senhores Juízes sabem que não há democracia sem juízes verdadeiramente independentes.

Ainda a propósito desta greve dos Srs. Juízes, Magistrados e Funcionários Judiciais, atrever-me-ia a propor uma pequena reflexão sobre um comparativo que incide num estudo estatístico dos Tribunais Portugueses e os Tribunais dois países mais próximos, Espanha e França. Estes números deveriam levar a Sociedade Portuguesa, a questionar-se sobre as razões da morosidade do sistema judicial no nosso país, onde parece haver melhores condições funcionais do que nos outros dois, onde os sistemas judiciais se revelam bem mais rápidos e eficazes. Atente-se então:

Em 1992, havia em Portugal 6000 funcionários judiciais que em 2001 passaram a 9000. Deste modo, cada funcionário judicial que, à data de 1992, cabia despachar cerca de 117 processos, passou, à data de 2001, a despachar apenas cerca de metade (69 processos).

Outro número curioso é que nos três países, à data de 2001, o número de Funcionários Administrativos por cada 100.000 habitantes, passou a ser: em Portugal 93,5 funcionários, em Espanha 89,2 funcionários e em França 26,1 funcionários.

Também em 2001, por cada 100.000 habitantes havia: em Portugal - 3,2 Tribunais ; em Espanha - 1,3 Tribunais; e em França - 0,8 Tribunais. Para os mesmos 100.000 habitantes, a relação do número de juízes era a seguinte: em Portugal 14 juízes, em Espanha 10 juízes e em França -11 juízes.

Perante um cenário tão favorável, em relação aos nossos parceiros europeus, acrescido do facto de ser o segundo sistema judicial mais caro da União Europeia, num país em crise, admitamos que é muito difícil ao comum dos cidadãos compreender as dificuldades da Justiça em Portugal e, sobretudo, as reivindicações dos Senhores Juízes.