quarta-feira, junho 29, 2005

A Exclusão (Social) bem antes do Arrastão

Aí estão as consequências de um verdadeiro fenómeno de exclusão social das zonas suburbanas da grande metrópole. Pessoas revoltadas pelas condições degradadas em que vivem, resultantes de uma Escola que exclui todos aqueles que se não enquadram nos seus curricula, por uma imigração completamente descontrolada, pela ausência de uma verdadeira Segurança de Estado, pela falta de uma cultura de responsabilidade e pela falta de autoridade, nomeadamente dos pais, da Escola e das Instituições. Os bairros degradados, as famílias numerosas e desestruturadas, e a Educação e Sociabilização, são uma permanente construção de rua. Esta é a imagem de uma desgraçada pobreza suburbana que determina de forma indelével a personalidade de jovens revoltados que, à sua frente, não vêem qualquer perspectiva de futuro.
Deste modo, os percursos de vida destes jovens parecem confirmar a ideia de que a pobreza se reproduz de geração para geração, isto se considerarmos que a sua fraca escolarização e qualificação profissional, a precariedade dos seus rendimentos e as condições de vida, à qual sobrevivem no dia-a-dia alimentam a estratificação social, reproduzindo incessantemente a pobreza e a marginalidade. Por incrível que pareça, só agora, “a bomba social” explodiu!
Por infeliz coincidência, no dia 10 de Junho, Dia de Portugal, teve lugar na conhecida praia da Linha de Cascais, o tão propalado “arrastão” que desde então faz parte do nosso léxico, vindo também a atirar Portugal para a ribalta da actualidade, pelos piores motivos.
O pânico ter-se-ia gerado ao início da tarde, quando centenas de indivíduos, em bandos, começaram de repente a assaltar e a agredir os banhistas. Os comentários do acontecido, quer na imprensa nacional, quer na imprensa internacional não se fizeram esperar, relatando-se o pior possível. Nas crónicas lavradas pelos jornalistas, foi “pintado um quadro muito negro”, sobre a segurança do país. Portugal que precisamente nessa tarde tinha celebrado o Dia da Portugalidade, teria também, deixado de ser o habitual país de brandos costumes?
Ora, na sequência daquilo que se passou, Portugal que sempre se orgulhou do seu multiculturalismo, passou de imediato a ouvir os recados de xenofobia que surgiram de vários lados, mas, sobretudo, dos “patriotas” militantes da Frente Nacional que, acompanhados de perto dos seus amigos nostálgico-salazarentos de provecta idade, iriam apelar à nossa raça, (pura?) pelo que logo convocaram uma manifestação para o largo do Martim Moniz em Lisboa.
Portugal sempre foi um país que se afirmou ao longo dos séculos pela assimilação de culturas e pela simbiose de raças, aliás nós próprios somos um verdadeiro exemplo da miscigenação dos diversos povos que habitaram a Península Ibérica, muito antes da fundação da nacionalidade (celtas, fenícios, iberos, cartagineses, visigodos, gregos, romanos árabes e judeus entre outros. Como muitos de nós, poderemos ainda recordar, os períodos mais negros da nossa História estão quase todos ligados ao maniqueísmo, à intolerância e ao orgulhosamente sós.
Importa referir de forma peremptória que a violência e a criminalidade não são, em caso algum, merecedoras de contemplação ou tolerância de espécie alguma, qualquer que seja a cor de quem a gera ou de quem a pratica. A questão da criminalidade, não tem por isso, nada a ver com a cor ou a origem geográfica daqueles que cometem crimes. A principal forma de encarar este problema social está sobretudo na forma firme e rigorosa como a criminalidade é combatida. Tão simples como isso!
A prevenção parece ser de longe a melhor forma de as combater, pois parece resultar mais que a instituição de um estado policial, com um agente de segurança a cada esquina.
Quanto aos imigrantes que nos procuram, a fim de terem uma vida melhor que nos seus países de origem, a sua integração não é, nem pode ser, de um só sentido. As características culturais dos diversos povos devem ser preservadas e mesmo integradas na sociedade portuguesa. Por isso é que a integração tem sempre dois sentidos e, a nossa cultura, como qualquer cultura forte só sobrevive e se fortalece absorvendo componentes de outras. Só desta forma digna poderemos continuar a celebrar a nossa Portugalidade orgulhando-nos da Diáspora.

quinta-feira, junho 16, 2005

Eugénio de Andrade – a sensibilidade dos afectos no amor com Alma!...

Que dizer do desaparecimento de Homens com a dimensão deste beirão poeta, a quem um dia chamaram José Fontinhas, mas que cedo se refugiou na personagem grande de Eugénio de Andrade?
Poeta de prestígio, era dos nossos raros escritores vivos com verdadeira projecção internacional, e o mais traduzido, (cerca de 20 línguas). A sua obra tem obtido elevado reconhecimento literário consubstanciado em prémios nacionais e internacionais atribuídos
Homem de grande desprendimento material, viveu sempre, deliberadamente distanciado, da vida social, ou mundana, rebelde, sempre avesso à comunicação social, deliberadamente arredado de encontros, colóquios ou congressos; as suas raras aparições em público aconteciam apenas em tertúlias de amigos mais íntimos com quem partilhava emoções e afectos. Desde sempre nos falou através da sua linguagem poética, sentida, e plena de emoção, de afectos e sensibilidade.
De Eugénio de Andrade permanecem em nós, os seus poemas de palavras roubados à morte, que dela o libertaram, perpetuando-lhe a sempre efémera vida. Poucos como ele conseguiram perpetuar o efémero só percepcionado pelos sentidos de quem realmente os utiliza, sentindo… Ninguém melhor que ele, através da sua rara sensibilidade para consolidar esta estranha sensação de continuar connosco. Na intemporalidade de Eugénio deparamos com a simplicidade das suas palavras numa poesia tornada num sentir de afectos… Por tudo isto o José Fontinhas, que agora foi a sepultar, tinha falecido há muito; a ele sobreviveu o Eugénio que connosco permanecerá para sempre!...

quarta-feira, junho 15, 2005

Álvaro Cunhal – Homem de princípios e de convicções


Há dias ouvia um analista referir que à semelhança da ideologia comunista, Álvaro Cunhal, foi também ele, um perdedor e, portanto, politicamente um vencido. Apesar de não perfilhar das suas convicções nem do seu ideário político, não estou de acordo que tenha sido um vencido, sobretudo quando acabamos de assistir nas televisões a imagens emocionadas, autênticas, espontâneas dos seus camaradas, amigos e admiradores, de todos os quadrantes políticos, prestando-lhe a última homenagem!... Essas imagens reflectem exactamente o contrário, ou seja de um autêntico vencedor ideológico. O mar de gente que o acompanhou à sua última morada comprova-o de forma indelével.
Cunhal foi sempre um lutador insano pelas ideias em que sempre acreditou. A grandeza dos Homens não se mede pela conquista do poder pelo poder, nem dos bens materiais que esse poder lhe confere. A verdadeira dimensão do Homem, advém do exemplo que fica, na herança de tudo aquilo que nos lega. Pode discordar-se das suas ideias e da sua visão do mundo, mas ninguém discordará da sua dimensão como Homem de princípios e de convicções. Como todos os homens desprendidos, que se entregam a grandes causas, Cunhal foi também tímido e avesso à publicidade. O seu despojamento quase total, responsável por uma vida espartana, reforçou ainda mais a sua autoridade na luta por tudo aquilo em que sempre acreditou, reforçando ainda mais a sua capacidade de argumentação naquilo que defendia!
Professou valores rígidos e assistiu com dignidade e coerência ao esboroar do "seu mundo”, à decapitação do comunismo, onde nem a "sua" União Soviética foi poupada. Acredito que foi para ele um rude golpe ver cair o exemplo de organização política que sempre defendeu como o melhor dos mundos para o seu semelhante, derrotado às mãos da globalização capitalista.
Não tenho dúvida que ele sempre acreditou convictamente que tudo aquilo que defendia era o melhor para o seu Povo. Acredito também que ele renunciou a quase tudo em favor daquilo que pensava e defendia. Hoje, avaliamos a sua forte personalidade e convicção como poderíamos julgar uma personagem clássica de tragédia grega que sem vacilar enfrentou corajosamente o destino.
A exemplo de todos os grandes líderes, foi amado, mas também odiado. Com Homens desta dimensão ninguém pode, alguma vez, ficar indiferente. Como todos os grandes líderes, tenha-se gostado ou não dele, foi dos personagens mais fascinantes da nossa história política contemporânea. Com alguma ousadia, atrever-me-ia a compará-lo aos grandes líderes políticos do século XX, entre os quais destaco o Senense Afonso Costa.
Talvez um dia, a análise do seu espólio nos permita conhecê-lo ainda melhor, não só como político, mas também como escritor notável e artista plástico de elevada técnica e sensibilidade estética.
Por tudo isto, os “vencedores materiais” são, no momento, detentores da oportunidade de saber celebrar os ditos “vencidos”, não confundindo o respeito devido aos adversários, emitindo antes um sinal magnânimo de reconhecimento e valor humano a quem, com toda a justiça, é devido.

domingo, junho 05, 2005

A EURO SEMANA DUM INCÓMODO ANUNCIADO

E que fazer agora? … Seguir-se-à o Nim?...

Ao contrário do que poderá parecer, o [Não] francês é o resultado de um debate democrático e profunda reflexão, na sociedade francesa e não tanto, fruto de uma qualquer deriva nacionalista. Assim sendo, não parece correcto identificar os partidários do [Não] apenas com a "Front National" (Frente Nacional) do populista de extrema-direita, Sr. Jean Marie Le Pen, dado que a vitória do [Não] só é tornada possível com a votação maciça das forças políticas que naquele país se designam genericamente por "La Gauche” (Esquerda), nas quais, segundo os analistas franceses, incluem, em cerca de metade, o eleitorado do P.S. francês que se dividiu devido à adesão ao "Não", do socialista, Sr. Laurent Fabius, (Nº2 do PSF) que acaba de ser excluído da direcção do partido.
Só assim se poderia compreender a vitória do [Não]!.. Que aconteceu? À partida, era impensável colocar do mesmo lado da “barricada” líderes políticos tão díspares como: J.M. Le Pen, De Villiers, Laurent Fabius, Arlette Laguilier ou Marie-George Buffet (uma autêntica salada política que uniu nacionalistas de extrema-direita a comunistas e trotsquistas). Mais do que a reprovação do tratado da U.E. em si, a atitude do eleitorado francês foi, no essencial, uma resposta aos problemas de política interna do seu país e aos próprios políticos em si! Só é possível interpretar os resultados com alguma racionalidade. No entanto, é curioso relembrar que já nas últimas presidenciais o candidato da Esquerda ficou pelo caminho e a Esquerda não tendo outro remédio que votar Chirac”, para impedir uma vitória de Le Pen. Daí que não seria totalmente descabido reflectirmos sobre o peso que a extrema-direita teve neste referendo, isto é; quanto do [Não] poderá corresponder a um crescimento efectivo da Frente Nacional que não tem parado de crescer nos últimos anos!... (O ressurgimento dos nacionalismos na Europa, fazem com que esta questão se direccione não apenas aos franceses, mas sim a toda a U.E., pois estes contestam o que até agora se construiu consensualmente na UE: Maastricht, Schengen, o Euro, ou os alargamentos a Sul e a Leste).
No caso Holandês, além do peso significativo dos nacionalistas de direita, as razões mais invocadas pelos eleitores do [Não] são o descontentamento com o Euro e a frustração sentida pelos cidadãos holandeses de não serem ouvidos a pronunciarem-se sobre a adesão a tratados anteriores e à união monetária, decidida por políticos, mais ou menos, federalistas. Com o referendo, não perderam a oportunidade de retaliar com expressivo resultado.
Defendo que a União Europeia deve continuar a organizar-se como um grande espaço de liberdade; liberdade económica, liberdade de circulação de pessoas, liberdade comercial e de leal concorrência. Não me sinto um federalista, apesar disso defendo a ratificação do Tratado da Constituição Europeia, que é importante para definir as regras organizacionais da EU e, por isso, fundamental para os pequenos países como Portugal. Não defendo, a criação de um Super Estado Federal Europeu que reproduza modelos organizacionais semelhantes aos que existem nos EUA ou na Alemanha, baseados em instituições centrais. Os mais euro-cépticos, defendem que a experiência comunitária da U.E. não tem demonstrado a necessidade desse modelo de tratado. Nada mais errado! Afinal falta é saber qual é a verdadeira alternativa dos que defendem o [Não] à Constituição Europeia!
O Tratado Constitucional, apesar de algumas incongruências, rectificáveis, contém indeléveis referências à «Europa Social» que gradualmente tem vindo a ser construída. Não podemos esquecer-nos que a construção da U.E., como qualquer grande projecto humano, tem evoluído com altos e baixos de forma mais ou menos consensual pelas famílias políticas europeias: liberais, socialistas, democratas-cristãos, social-democratas, uma construção baseada na herança que nos advém da Antiguidade Clássica e consolidada em valores judaico-cristãos, com a tolerância e respeito pelo outro, mesmo com aqueles que são e pensam de maneira diferente. É este modelo de organização socio-económico e político, de cariz humanista, que torna a Europa tão atractiva às pessoas provenientes de outros povos e continentes. É este espírito que, apesar de tudo, nos torna orgulhosos do Velho Continente.
É provável que o [Não] da França e da Holanda, (fundadores da E.U) fira de morte o Tratado Constitucional, desacreditando as instituições Europeias tão empenhadas na sua aprovação, pelo que é previsível um período de instabilidade na União Europeia, devido a um mais que provável efeito de bola de neve que acabará por afectar os referendos que vierem a seguir… O desaire Franco-Holandês é também o desaire dos líderes e instituições políticas da U.E. que, de Tratado em Tratado, nunca deram a necessária relevância à opinião das populações que representavam, quando aprovavam ou colocavam os seus autógrafos nos compromissos que sancionavam.
Das consequências previsíveis do [Não] podem revelar-se, em possíveis obstáculos às entradas da Bulgária e da Roménia como, também, ao início de negociações com a Turquia previsto já para o mês de Outubro. Não querendo ser o profeta da desgraça, estou em crer que este falhanço anunciado irá certamente ser celebrado por todos aqueles que nunca desejaram ver uma Europa mais forte e coesa na cena socio-económica-política mundial, sendo previsível que se verifique grande satisfação em: Pequim, Washington, Tóquio, Nova Deli, ou até, imagine-se, nos eternos euro-cépticos ingleses da nossa “Velha Aliança”. E que fazer agora?… Seguir-se-à o Nim?...