terça-feira, abril 19, 2005

A LIMITAÇÃO DE MANDATOS E APRENDIZAGEM DA DEMOCRACIA


A limitação dos mandatos está na ordem do dia, é a discussão do momento! Não será esta limitação contraditória com o conceito de democracia? Sem dúvida! O exercício livre e efectivo da democracia, não pode ser substituído por disposições legais por melhores intenções que estas possam ter. Teoricamente e no plano dos princípios, sem dúvida que à primeira vista, a limitação de mandatos parece ser disparatada e até de efeito inócuo; talvez de efeito semelhante ao da "regra das quotas", no que se refere à inclusão de mulheres, a qual também não é pacífica. De facto esta medida atingirá em consciência, os direitos de escolha do eleitorado, impedindo que estes votem nos dinossauros. Contudo, a sua inconstitucionalidade não se coloca, uma vez que se entende não haver restrição a qualquer direito fundamental, pelo que a Constituição consagra o «princípio da renovação» no seu artigo 118º, onde se lê que «a lei pode determinar limites à renovação sucessiva de mandatos dos titulares de cargos políticos e executivos».
Em consciência, cada um de nós deveria reflectir se, passados 12 anos de mandato, não poderá haver também outras pessoas, até no mesmo partido político, que reúnam um conjunto de capacidades e competências que, pelo menos, complementem o trabalho que o seu antecessor desenvolveu?
Por outro lado, a longevidade do poder, característica essencial de qualquer ditadura que se preze, apesar de nos parecer já longínqua, está bem presente na memória colectiva das pessoas da minha geração, causando-nos, pelo menos, uma grande sensação de desconforto. Afinal muitos de nós lutaram contra a ditadura e o regime abominável do Estado Novo. Se é uma vantagem conhecer os dois lados, mais importante é saber que as novas gerações nem compreenderiam as motivações de um regime político ditatorial, que não permita sequer o elementar direito ao livre pensamento dos cidadãos!...
Mesmo depois de Abril, é lícito reflectir sobre a questão do perpetuar inquestionável dos mesmos actores, no exercício dos cargos políticos, nesta democracia representativa que se baseia, fundamentalmente, nos triturantes aparelhos partidários, cujos dinossauro-militantes se fazem prevalecer nos respectivos directórios, não abdicando do seu peso militante. Assim, os partidos do poder, além de acomodarem os referidos actores nos tão propalados lugares, vão protagonizar nestes, a chamada polivalência militante, isto é; os mesmos protagonistas servem para tudo ou quase tudo. Se não, atente-se: quando os detentores das pesadas militâncias, não se integram nas listas de deputados, são potenciais presidentes de câmara, quando deixam, ou não são eleitos presidentes de câmara, servem para governadores civis, quando não são governadores civis, servem sempre para outra coisa qualquer, quando… E esta roda não pára nunca, nas habituais clientelas dos partidos do poder. Casos não faltam para ilustrar o que acabo de referir, bastaria para tanto atentarmos na última passagem de testemunho, já após 20 de Fevereiro. Despachos e nomeações para segurar as clientelas que deveriam sair, mas que a todo o custo se agarram nos cargos, impedindo ou dificultando as novas clientelas que se perfilam para entrar, pois agora é a sua vez de se servirem. O importante é a obtenção do famigerado lugar de relevo pelas ditas, (condição de militante). A competência, essa, deixa de ter qualquer relevância em relação ao peso que a militância revela.
O Jornal Público refere que dos 308 presidentes de câmara, 67 exercem o cargo há mais de três mandatos. Cerca de um quinto do total. O PSD de Marques Mendes (cedendo a pressões de Jardim), vem agora dizer que a limitação de mandatos deve aplicar-se no futuro e nunca retroactivamente, referindo que estes princípios essenciais não se negoceiam. Ou seja, se esta lei só começa a contar (três mandatos depois), acabando por ser um faz-de-conta. (É só rir!...)
Se ambos os partidos estão de acordo, vamos ser sensatos!.. Se a ideia é moralizar e evitar caciquismos, que existem certamente em todas as forças políticas, não me parece que se consiga já, mas é uma boa notícia caminharmos nesse sentido. Se 67 presidentes têm agora mais de 3 mandatos, abrangendo um leque variado de actores, então porque não começar contar desde já? Porquê só 3 mandatos adiante? Claro que haverá sempre uma grande disparidade entre os que se candidatam agora e os que já cá estavam. Tanto que o Presidente do PSD madeirense baptizou o diploma com o seu nome. Prometendo ficar a rir-se da lei. Alberto João Jardim está convencido que a proposta de lei é à medida de si próprio, referindo que “uma vez que não lhe conseguem ganhar nas urnas, há que lhe ganhar na secretaria”. Este dinossauro da política, está há 27 anos no poder! Com mais 3 mandatos (propostos por Marques Mendes) chegará ao 40 anos, estabelecendo um novo recorde de tempo de governação nas democracias ocidentais e por pouco, arriscava-se quase a bater o recorde de Oliveira Salazar. E pensar que ainda há quem defenda este estado de coisas… Simplesmente lamentável!...
Passados que são mais de trinta anos sobre Abril, é notório que continuamos o nosso gradual percurso de aprendizagem da democracia. Neste sentido, é importante que alguém tenha dado um primeiro passo no sentido de melhorar a qualidade da nossa democracia, tornando-a mais adulta, autónoma e equilibrada. Afinal tal como o Presidente dos Estados Unidos, (a mais paradigmática das democracias do mundo) o cargo de Presidente da República está limitado a apenas 2 mandatos, sendo esta limitação uma questão pacífica.
É no entanto desejável uma reforma mais vasta! É minha convicção que a qualidade da democracia está fortemente dependente da capacidade de renovação dos dirigentes políticos, de uma maior mobilidade entre o exercício desses cargos e o desempenho de funções privadas, de uma maior competição no acesso e de um substancial alargamento da base de recrutamento desse pessoal; a política teria muito a ganhar com uma participação mais alargada dos cidadãos e uma maior competição no exercício dos cargos públicos.
A proposta de lei vale o que vale, parecendo no entanto ir permitir, minimamente, a renovação dos protagonistas na política portuguesa e reeleger novos actores nos cargos executivos; pena é que a lei não seja já extensível à maioria, se não a todos, os cargos políticos. Acredito, seguramente, que com o tempo vamos lá!...

segunda-feira, abril 18, 2005

MARQUES MENDES E OS RESULTADOS DO CONCLAVE LARANJA

Após o castigo eleitoral das legislativas, qualquer analista político ou cabeça pensante defenderia que Santana Lopes não deveria regressar logo à política, nem sequer à CML, devendo prudentemente afastar-se por algum tempo. E não é que o homem insiste? O circo continua até que o PSD e o novo líder tenham a coragem de travar e o chamar à razão, afastando-o compulsivamente. Já ficou óbvio no último congresso que Santana Lopes não quer sair. Quer continuar «a andar por aí» e de preferência com um lugar do seu agrado. Santana, através de Meneses, quis impor a sua presença (e quase o conseguiu)... O que ele recusou liminarmente foram os conselhos de recolhimento por uns tempos.
Agora que voltou à CML, é deprimente verificar como, a qualquer preço, Santana Lopes se quer manter nas luzes da ribalta, na crista da onda, a todo o custo, parecendo não se preocupar verdadeiramente com os problemas reais que Lisboa tem pela frente. Este homem que ganhou renhidamente a CML a João Soares, deveria não defraudar quem o elegeu mas antes, resolver, como prometeu, o problema do túnel, do Parque Mayer, da Feira Popular, dos prédios que caem e dos bairros completamente degradados. Foi por isso que foi eleito. Mas não, tinha que sair antes de acabar o mandato e, finalmente, ser primeiro-ministro. O seu apego pelo poder, como é habitual, tira-lhe discernimento. Será que algum dia irá perceber, que os portugueses ficaram fartos das suas trapalhadas? Santana Lopes, deveria tomar em conta os bons exemplos e os bons conselhos, mas não aceita... Que raio de teimosia! Tem que ser falado todos os dias, seja lá pelo que for. Depois de ter sido justiçado pelas eleições, tinha que ir arranjar novamente problemas, agora na CML.
Enfim, adora o poder, seja ele qual for, infelizmente para quem tem que o aturar. Santana Lopes mostra aquilo que sempre o caracterizou: um aventureiro para quem os fins justificam os meios. Não sabe perder, pois a ambição não lho permite. Daí criar os maiores constrangimentos ao próprio partido, que desde sempre alimentou as suas vaidades pessoais.
Não me imagino no papel de Carmona Rodrigues. Será que alguém tem o direito de usar as pessoas desta forma tão indecorosa? Desejável mesmo era Santana Lopes acabar com as birras e ter um pouco de vergonha. Lamentavelmente não a tem. Por tudo isto, a maior Câmara do País está a navegar ao sabor dos ventos de duas criaturas que no mínimo deveriam respeitar os munícipes eleitores. São só trapalhadas, jogos de bastidores, santanetes contra carmonetes. Acredito que o PS esfregue já as mãos de contente com os dislates destas duas criaturas, arriscando-se, a ganhar a Câmara, mesmo com o candidato MM Carrilho.
Sabe-se agora que além das negociatas com os amigalhaços, os apressados despachos de última hora, a que se juntam cerca de 1000 hilariantes louvores aos seus colaboradores, está um atentado ambiental, que me incomoda de forma preocupante, assinado a todo o vapor pelo ex-ministro do Ambiente, Nobre Guedes. Um despacho suspeito, destinado a permitir cortar impunemente 3000 sobreiros de reserva florestal, imagine-se, para permitir a construção turística por uma Holding. Neste apressado desnorte, vamos aguardar o que ainda estará para se descobrir. O que custa mesmo suportar, é a falta de uma cultura de responsabilidade que persiste em prevalecer neste triste e tão mal tratado país. A culpa, essa infeliz, como sempre, morre solteira! Os responsáveis entram e saem com a maior ligeireza, ficando sempre impunes, apesar dos actos de má gestão e, o que é mais grave ainda, de alguns actos de gestão danosa. Santana Lopes e aqueles o acompanharam na sua ilusão, deveriam prestar contas, não só pela sua vaidade e ambição desmedidas, mas, sobretudo, pelo desgoverno a que nos sujeitaram. Assim cá vamos descobrindo, aos poucos, os resultados da sua (in)governação populista.
O PSD é um partido de poder, com um espectro eleitoral muito amplo que vai do centro-esquerda à direita. Não professando uma ideologia social-democrata vincada faz, sobretudo, o culto dos seus líderes pragmáticos, (atente-se em nomes como Sá Carneiro ou Cavaco Silva sempre presentes) por conseguinte, não será fácil ao líder agora eleito gerir o seu partido, na oposição, durante os próximos anos.
Um PSD forte é fundamental à democracia portuguesa, pois só uma oposição construtiva, exigente, forte e credível poderá elevar o nível da governação como, eventualmente, estar preparado para ser alternativa. Mesmo fragilizado, com os surpreendentes resultados da votação no congresso, quero, como agora se diz, parabenizar o Dr. Marques Mendes, a quem saúdo e desejo as maiores venturas na condução do partido. Seja ele capaz de pôr definitivamente ordem na casa!...
A prova provada que Santana Lopes e Alberto João Jardim, mesmo durante o conclave laranja, «já andavam por aí», foi o excelente resultado obtido por Luís Filipe Menezes, 43,4%, bem melhor do que qualquer militante poderia esperar. Só deste modo se poderá explicar que a vitória de Luís Marques Mendes, por uma margem bem mais estreita do que qualquer analista poderia prever. Neste contexto e interpretando os resultados do congresso não há dúvida que eles, efectivamente, «nunca deixarão de andar por aí». Acredito antes, é que já sejam bem poucos, aqueles que estejam por aí, dispostos a ouvi-los.

domingo, abril 03, 2005

Homens que não morrem nunca!...



Faleceu uma das figuras mais marcantes da História Contemporânea.
Desde a sua assumpção do cargo papal, tanta coisa mudou na Europa e no Mundo, basta recordar a Guerra-fria, a queda do famigerado Muro de Berlim e a desintegração da antiga União Soviética.
Este apóstolo da paz foi por razões da organização política do seu próprio país, a Polónia, um grande lutador contra o marxismo totalitário. Já numa segunda fase, indo de encontro à Doutrina Social da Igreja, mostrou ser também um adversário do liberalismo selvagem que torna os ricos cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. A sua Mensagem teve sempre como temas centrais: a unidade dos cristãos e o ecumenismo.
Durante o seu pontificado, João Paulo II considerou a vida, o pão, a paz e a liberdade os maiores desafios que a Humanidade enfrenta na actualidade, tendo disso dado conta aos responsáveis mundiais.
Na campanha em defesa da Vida, da Família, e da própria Igreja como instituição, elementos fundamentais e nucleares da sociedade em que vivemos, não conseguiu libertar-se do ancestral conservadorismo da instituição, pelo que não teria acompanhado e dado sinais de alguma abertura da Igreja à mudança dos tempos e evolução das relações e regras sociais em temáticas tão importantes como: a sexualidade, o matrimónio, a ordenação das mulheres, ou o matrimónio dos padres. De facto, esperava-se um pouco mais.
A fome ou seja a ausência de Pão, em referência aos milhões de seres humanos que sofrem gravemente de desnutrição e dos milhões de crianças que a cada ano morrem de fome ou das suas consequências. Recordando “o princípio do destino universal dos bens da terra” que deve motivar um compromisso radical para a justiça e um esforço de solidariedade mais atento e determinado. Este é o bem que poderá vencer o mal da fome e da pobreza injusta.
Era com pesar que em vez de Paz falava dos conflitos armados que fossem entre Estados, (foi frontalmente contra a invasão do Iraque) e também de conflitos étnicos entre povos e grupos que vivem num mesmo território e que tantas vítimas inocentes causam. Defendia que os conflitos no Oriente Médio, África, Ásia e América Latina, causavam não só danos materiais, mas fomentavam também o ódio e faziam crescer a discórdia, sem esquecer o fenómeno cruel e desumano do terrorismo, flagelo que alcançou uma nova dimensão. Nestes males, dizia o Santo Padre, que à prepotência se devia opor a razão; ao confronto da força, o confronto do diálogo; às armas apontadas, a mão estendida; ao mal, o bem. Para construir a paz verdadeira e duradoura, é necessária uma força de paz que não retroceda ante nenhuma dificuldade.
Este peregrino da Liberdade promoveu em tantos países e culturas outros tantos debates em torno dos diferentes conceitos de laicidade e religiosidade, defendendo que não havia que temer que a justa liberdade religiosa fosse limite para as outras liberdades ou prejudique a convivência civil. Defendia ainda que “a liberdade religiosa se desenvolve e floresce também qualquer outra liberdade, porque a liberdade é um bem indivisível e prerrogativa da própria pessoa humana e de sua dignidade”.
Inefável peregrino, com uma notável capacidade de entrega por causas, valores em que acreditava e pela fé em que sempre o orientou. Um verdadeiro exemplo a todos nós. Foi inicialmente muito céptico à corrente da chamada Teologia da Libertação que florescia na América do Sul, mudou posteriormente a sua posição quando se deparou que aquelas gentes tão pobres mas extremamente católicas pouco mais tinham do que a própria espiritualidade, nada mais restava do que aquele cristianismo marxista. Teve também a humildade, (e isto é histórico) de pedir perdão pelos erros cometidos pela Igreja ao longo dos tempos.
João Paulo II tinha um carisma tão especial de simpatia e de comunicação, que conseguiu o feito notável de captar não só a atenção e admiração de todos os povos, culturas, religiões do planeta mas também, o que é mais notável ainda, o interesse e o entusiasmo dos mais jovens às causas que sempre defendeu.
Homem de notável dimensão Social e Espiritual, deixa a todos nós e, fundamentalmente, à Instituição que representou sempre com a maior dignidade um legado fabuloso, quer na forma, quer no conteúdo, saibamos nós e a própria Instituição Igreja, ser merecedores de tão preciosa herança.